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RESUMOS: USO DO LÚDICO NO DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICO


USO DO LÚDICO NO DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICO

Maria Lucia Leme Weiss



            Todo profissional que trabalho com crianças sente que é indispensável haver um espaço e tempo para a criança brincar e assim melhor se comunicar, se revelar. No trabalho psicopedagógico, chega-se à mesma conclusão. Empregamos a palavra lúdico ao longo do texto no sentido do processo de “jogar”, “brincar”, “representar” e “dramatizar” como condutas semelhantes na vida infantil.
            A técnica do jogo em Psicanálise foi elaborada por M. Klein, Anna Freud, Lowenfeld e outros. Piaget, mostra a elaboração do jogo nas diferentes idades. Mas, a visão de Winnicott, possibilita uma compreensão mais integradora do brincar da aprendizagem. Assim resume seu pensamento: “É no brincar, e somente no brincar, que o individuo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral; e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu (self) (1975, p.80)”.
            No brincar, a criança constrói um espaço de experimentação, de transição entre o mundo interno e o externo.
            Nesse espaço transacional: criança-outro, indivíduo-meio, dá-se a aprendizagem.
            No diagnóstico, o uso de situações lúdicas é mais uma possibilidade de se compreender, basicamente, o funcionamento dos processos cognitivos e afetivo-sociais em suas interferências mútuas, no Modelo de Aprendizagem do paciente.
            Ao se abrir um espaço de brincar durante o diagnóstico, já se está possibilitando um movimento na direção da saúde. Rompe-se assim a fronteira entre o diagnóstico e o tratamento.
            A sessão lúdica diagnóstica distingue-se da terapêutica, porque nessa o processo de brincar ocorre espontaneamente, enquanto que na diagnóstica há limites mais definidos. Nesta última podem ser feitas intervenções provocadoras e limitadoras para se observar a reação da criança.

Sessão Lúdica Centrada na Aprendizagem

            Imaginei o uso da “Sessão Lúdica Centrada na Aprendizagem”, após ter experimentado durante vários anos, de forma sistemática, os instrumentos como E.O.C.A. (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem) e a “Hora do Jogo” em diagnóstico.
            Senti que para algumas crianças a E.O.C.A. ficava excessivamente formal. Nesses casos, observei que o produto inicial era de pior qualidade do que o apresentado no final do diagnóstico, quando eu repetia algumas das atividades feitas na E.O.C.A. dando um “ar lúdico”, e concluí que a produção do paciente era melhor.
            Experimentando a “Hora do Jogo Diagnóstico”, de diferentes formas, com facilidade eu obtinha dados sobre aspectos afetivos gerais da aprendizagem.
            Nesse instrumento, quase não havia espaço para condutas relacionadas à aprendizagem escolar formal reveladoras do nível pedagógico da criança. Tal fato passou a exigir uma avaliação pedagógica mais formalizada em momentos posteriores o que me levou a fazer críticas semelhantes às feitas à E.O.C.A.
            Tentei integrar as estruturas dos dois instrumentos. Acrescentei também jogos formais. Observei que as crianças ficavam mais espontâneas e se revelavam com mais facilidades. Pude perceber a total rejeição aos objetos de aprendizagem escolar, o uso inadequado desses materiais ou procura espontânea e prazerosa de livros e tentativas de escrita, sem que eu propusesse nada.
            A partir dessas experiências, passei a adotar sistematicamente o uso dessa forma de sessão, obtendo sempre resultado satisfatório. Consegui diminuir o tempo usado no diagnóstico e o número de instrumentos. Paralelamente, obtinha dados já mais globalizados que permitiam a compreensão mais rápida do sujeito e o levantamento de hipóteses para prosseguir com o diagnóstico.
            Os diferentes aspectos da Sessão Lúdica Centrada na Aprendizagem estão analisados a seguir.
            O material deve atrair pelo seu possível uso e não por ser diferente do usualmente utilizado pela criança.
            A apresentação do material à criança pode ser feita de diferentes modos, dependendo do objetivo definido para aquele momento de atividade lúdica.
            A atividade lúdica, por não ser dirigida, exige uma explicação inicial, colocando a criança à vontade.

Observação e Avaliação de Atividades Lúdicas

            Por ser o jogo inerente ao homem, e por revelar sua personalidade integral de forma espontânea, é que se pode obter dados específicos e diferenciados em relação ao Modelo de Aprendizagem do paciente. Assim, aspectos do conhecimento que já possui, do funcionamento cognitivo e das relações vinculares e significações existentes no aprender, o caminho usado para aprender ou não-aprender, o que pode revelar, o que precisa esconder e como o faz podem ser claramente observados através do jogo.
            Deve-se tentar analisar o significado possível do material, da brincadeira, das ações necessárias para realizar a atividade que foi planejada.

Exemplo 1:
            O diagnóstico de Pedro (6anos, C.A.), foi conduzido de forma lúdica, mas com interferências propositais do terapeuta, a fim de verificar sua reação a propostas específicas. A queixa da escola era de que ele não participava das atividades solicitadas e afirmava que não queria aprender a ler e a escrever. Os pais tinham duvida se ele não aprendia mesmo ou se apenas não queria mostrar o que sabia.
            A conclusão após a terapia foi que Pedro possui vocabulário e nível de cultura geral muito bons para a idade. Não é preciso aplicar testes e provas para se perceber o seu bom nível intelectual. Raciocina com causalidade, lógica e coerência, revelando se aproximar do final do pensamento pré-operatório. Gosta de conhecer, de explorar. Foi fácil perceber seu nível pedagógico. Além disso, mostrou conhecer a diferença entre escrita convencional e a que era capaz de produzir. O caso de Pedro serve-nos como comprovação de que nem sempre há necessidade de aplicar testes e provas para se chegar a conclusões diagnósticas.

Exemplo 2:
            Carlos (8 a. 6m.), ainda analfabeto, tinha sido convidado a se retirar de uma segunda escola particular, de boa direção pedagógica. Na primeira sessão, foi fácil perceber a vinculação inadequada com a aprendizagem escolar, revelada pela ansiedade e raiva demonstradas em relação a seus objetos mais expressivos. Trabalhando esse emergente afetivo, de forma fusional, criei a possibilidade dele agir mais livremente. Em outras sessões, apresentei objetos que me permitissem avaliar as suas possibilidades de seriar e classificar.
            No jogo de Pega-varetas pude observar, além da motricidade fina, vários aspectos lógico-matemáticos. Vi como lidava com o sucesso e o fracasso, com o cumprimento de regras e mais uma vez a rejeição a escrever o placar do jogo. Verifiquei que se encontrava totalmente no período pré-silábico, segundo as hipóteses levantadas por pesquisas de Emília Ferreiro, o que tornava difícil sua alfabetização segundo as exigências das cartilhas escolares. Carlos possui a estrutura de pensamento totalmente no nível pré-operatório, com dificuldades temporais e espaciais, tendo processo exageradamente assimilativo.
            Carlos apresentava graves problemas emocionais oriundos de sua história familiar. Como as diferentes escolas não souberam lidar com suas dificuldades, agravou-se o seu caso, ficando evidente um bloqueio no funcionamento intelectual em relação à aprendizagem escolar.
            Recomendou-se, inicialmente, um atendimento psicopedagógico para Carlos resgatar sua relação com a aprendizagem formal, escolar, possibilitar a organização e o desenvolvimento cognitivo-afetivo, acompanhado de terapia familiar. Indicou-se também, para um momento posterior, um atendimento psicoterápico.

BIBLIOGRAFIA
WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia Clínica – Uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. 13 ed. Ver. E aml: RJ Lamparina.2003.


















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